segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Viva a cena gay de Porto Alegre!

Domingueira, a cena gay da Cidade Baixa me emociona porque resiste a todos boicotes criativamente e nisto, parece ganhar cada vez mais força na capital gaúcha.
Expulsos do Guion - que hoje está à merecidas moscas por colocarem para fora o povo que fez a fama do lugar - foram para a rua e ocuparam mais uma calçada, a do Zaffari, que logo construiu uma cerquinha, uma espécie de guarda-vômitos, ao redor do mercado. Feito cobra, a galera se espichou para mais uma quadra. E se espichará por toda a cidade, feito jibóia, trucidando os valores hétero-normativos, até serem colocados para dentro, como gente merece ser tratada.
E são muito jovens, são adolescentes, são minha esperança num futuro menos careta que este presente insípido. São a contracultura deste tempo anorgástico do politicamente correto.
Continuando a série "em busca do século XXI", como é que pode as pessoas não poderem viver suas relações afetivas livremente? Quando foi que se decidiu que ser homo, bi, pan-sexual, não era legal? Hein? Hein? Hein?

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Em busca do século XXI

Quando era criança, calculava com minhas amiguinhas quantos anos teríamos no ano 2000, o mundo ia acabar e tínhamos muito a fazer antes disso. Na adolescência eu já sabia que o ano 2000 não era o fim. Era sim o começo da era da liberdade, eu acreditava.

Meus amigos, bem mais velhos que eu, se casavam e, de repente, a gente não podia mais andar de mãos dadas ou ter o prazer de uma conversa a sós. Então, eu comecei a pensar que as relações abertas e confessionais eram a proposta revolucionária para o novo século.

Depois, aprendi que o termo "relação aberta" é tão careta quanto os que definem relações convencionais, pois partem também do princípio da concessão, como se um outro tivesse o direito de decidir o que podemos sentir.

Quase no fim da primeira década do novo século, artefatos como o cinto de castidade foram abolidos e nenhuma mulher precisa estender o lençol com o sangue de sua virgindade na janela. No século XXI o cadeado foi substituído pelas confissões que, quase sempre associadas ao discurso da confiança, servem ao controle, a alimentação do ciúme, a desconfiança sobre o silêncio do outro e ao desrespeito a privacidade.

Ouvi dizer que se a gente não conta (confessa) tudo sobre a nossa vida o outro cria expectativas falsas. E se a gente conta, o outro não cria expectativas? E se a gente muda, o que faz com as expectativas sinceras que o outro criou? Então será que amar é não mudar nunca?

As confissões não deixam marcas no corpo, nem causam infecções e são democraticamente partilhadas por homens e mulheres que, honestos, não tem nada a esconder. As vísceras estão na mesa, é só se servir.

No século XXI, os vínculos amorosos seriam libertários, as pessoas estariam juntas apenas por se amarem, eu sonhava. A monogamia continuaria sendo o que sempre foi: um estado da relação, impassível de controle por contrato. As pessoas poderiam amar um, dois, três. Os amantes, por amor, renunciariam a posse.

Mas uma onda de caretice varre o mundo. Os filhos dos hippies são contra a legalização das drogas e a favor da venda sem prescrição médica do Rivotril. Seu sonho, estabilidade no mercado de trabalho. E a marca do século XXI, as privatizações.

Privatizem homens, privatizem o quanto puderem. A liberdade e sonho não tem dono, nem são passíveis de negociação. É o que nos faz humanos.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Bilhete anônimo

Era o casal mais astral da minha rua e tinham filhos pequenos que brincavam comigo. A crise bateu-lhes a porta e Sérgio, bancário desempregado, teve que trabalhar de motorista de ônibus. Foi nesta época que uma tia minha entrou na vida deles. Por duas vezes pegou a linha de Sérgio e notou que ele conversava muito com uma moça. Concluiu: é caso!
Um bilhete anônimo colocado embaixo da porta deveria ser a redenção da esposa traída e a garantia de um pouco de emoção a vida de minha tia, seca por um intriga fazia mais de dia. Isto foi numa quinta e Iara, a esposa, não foi vista até o sábado. Quando saiu do claustro foi direto a minha casa. Abatida disse logo a minha mãe, "vamos embora para Minas".
Minha mãe, por detestar fofoca, não dedurou minha tia. Limitou-se ao alerta,"Iara, você não vê que teu marido te ama? Todo o povo tem inveja da tua felicidade. Ô Iara..." Não adiantou. Domingo o caminhão encostou e partiram.
Um dia foram em casa visitar: os filhos crescidos, várias cidades mineiras no currículo e uma tintura loira no cabelo de Iara que não entendi até hoje.
Sérgio, calado como antes, terno como sempre.